segunda-feira, 29 de junho de 2015

A DESPEDIDA (por Vlad Araujo, em 29/6/15)

*DESPEDIDA* (publicação no blog do autor - www.vladdf.blogspot.com.br) 

Sentou-se à beira da cama, como era quase um hábito. Nesta posição, com as pernas a balançar no alto, comparava este momento a quando era criança e sentava-se no dique com as pernas para balançar e o lago corria por baixo...

Hoje,  suas pernas cansadas, trôpegas e franzinas, quase não sustentavam mais sua coluna, tampouco seu corpo esquálido.

Debaixo do colchão, sacou e alisou os cigarros – a carteira parecia quase inefável, reluzente, ainda mais bonita que de costume! Há quanto tempo não dava um bom trago? Não se recorda, talvez no aniversário do Diretor do hospital, enquanto todos convergiam para o salão de festas (improvisado, na verdade, uma sala de cirurgia há muito desativada, mas que costumava ser louvada em chá de bebês aniversários e com congêneres, pôde escapar e dar uma pitada no banheiro. O tempo se esvanecia em sua mente, e nem se recordava de sua última visita...

Olhou para o teto, para o maldito ventilador barulhento, ali dependurado, que lhe cortava o silêncio – de que adiantava reclamar? Ele era apenas um, numa enfermaria com mais 5, e os outros sentiam calor. 

Então...como se preparasse seu corpo para um mergulho num riacho doce, como se embarcasse no trem de uma montanha russa, acendeu com dificuldade o isqueiro (subornara o enfermeiro, para lhe comprar um), deu sua última baforada...um sorriso torpe lhe preencheu a face - num atmo, vira o ventilador de teto parar suas hélices, o tempo andar em marcha lenta, e em meio à fumaça, sentiu-se nas nuvens... e certamente para lá foi.